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Ética e Inteligência Artificial aplicada ao Poder Judiciário

15/02/2021

Resolução nº 332/2020

As preocupações com os desdobramentos provocados pela aplicação de sistemas de Inteligência Artificial (IA) no Poder Judiciário são crescentes, tanto na literatura especializada, quanto no espaço de policy makers. Este é o contexto no qual o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em iniciativa pioneira regulamentou o uso dessa nova tecnologia, estipulando princípios, padrões e diretrizes de governança na Resolução nº 332/2020.

A transformação tecnológica do Poder Judiciário brasileiro, em que se insere o debate ético sobre IA, apresentou várias evidências ao longo de 2020. Mais recentemente, nesta segunda semana de fevereiro de 2021, também podem ser destacados outros indicativos. O Supremo Tribunal Federal (STF) divulgou que está próximo de se tornar um Tribunal 100% digital. Hoje, a Corte tem menos de 900 processos físicos em andamento, o que representa 3% do acervo. O CNJ noticiou que os editais para o programa “Justiça 4.0: inovação e efetividade na realização da justiça para todos” se encontram abertos para analistas de ciência de dados, desenvolvimento em gestão da informação e de direito.

Digitalização nas atividades e mudanças nas exigências de mercado quanto à formação jurídica e às competências necessárias para as atividades desenvolvidas no Poder Judiciário são reconhecidas igualmente na declaração do Desembargador Henrique Carlos de Andrade Figueira, que assumiu, neste mês, a presidência do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro “a tecnologia, hoje em dia, é uma grande aliada do tribunal. Nenhum juiz hoje trabalha sem a tecnologia. A gente depende visceralmente dos sistemas, de computação, dos programas, para poder julgar”.

A aproximação dos sistemas de justiça com a IA é fato incontroverso, afinal essa tecnologia apresenta vasto potencial vocacionado a solucionar diferentes problemas e aperfeiçoar a prestação jurisdicional. O que se discute, nesse sentido, é a importância de o ciclo de vida dos sistemas de IA se ajustar ao arcabouço normativo-axiológico de um ordenamento jurídico nos limites de princípios éticos, que não obstaculizem a inovação, garantindo ao mesmo tempo os direitos fundamentais das pessoas humanas.

Entre as diretrizes éticas para utilização da IA no Poder Judiciário sublinha-se a necessidade de os cidadãos conhecerem a base da decisão automatizada, isto é, critérios, objetivos e lógica que permitiram aquele resultado, de maneira compreensível a sujeito que não detém conhecimento técnico. O que se aplica, da mesma maneira, aos sistemas de suporte a decisão, destinados, em geral, a auxiliar magistrados em situações, por exemplo, de entendimento jurisprudencial consolidado por Tribunais superiores.

Atento a isso o CNJ definiu que “a IA aplicada nos processos de tomada de decisão deve atender a critérios éticos de transparência, previsibilidade, possibilidade de auditoria e garantia de imparcialidade e justiça substancial”, sublinhando a obrigatoriedade no “fornecimento de explicação satisfatória e passível de auditoria por autoridade humana quanto a qualquer proposta de decisão apresentada pelo modelo de IA, especialmente quando essa for de natureza judicial”.

Soluções regulatórias organizadas por meio do diálogo entre as partes interessadas, que ponderem os diferentes interesses envolvidos e conciliem na regulamentação conformidade e inovação são etapas essenciais para que se mantenha aberto o debate ético sobre a aplicação de IA nos sistemas de justiça, principalmente quando a inovação tecnológica permite comparar resultados práticos entre jurisdições diversas.

Wilson Sales Belchior

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