STF declara a inconstitucionalidade de lei estadual sobre franquia de internet
15/02/2021
Inconstitucionalidade da Lei do estado do Ceará nº 16.734/2018
O Supremo Tribunal Federal (STF), por sete votos a quatro, declarou a inconstitucionalidade da Lei do estado do Ceará nº 16.734/2018 que impedia as operadoras de telefonia móvel “de bloquearem o acesso à internet após o esgotamento da franquia de dados”, sob pena de “pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00, acrescido em 50% no caso de reincidência”. Prevaleceu a divergência inaugurada pelo Ministro Dias Toffoli que entendeu pela inconstitucionalidade da norma jurídica estadual por violação a competência privativa da União para dispor sobre telecomunicações.
A Associação das Operadoras de Celulares (ACEL) propôs a ADI sustentando a competência privativa da União de legislar acerca de serviços de telecomunicação, bem como explorá-los direta ou indiretamente, destacando que a União é o único ente legitimado para definir condições à exploração do serviço e obrigações às operadoras de telefonia móvel. Isto porque o sistema nacional de telecomunicações depende de um ordenamento jurídico uniforme em todo o território nacional. Além disso, apontou-se ofensas ao princípio da isonomia e à livre iniciativa.
Frise-se que a matéria da norma impugnada já havia sido objeto de regulamentação pela Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) na Resolução nº 632/2014, a qual estabelece as regras sobre a oferta de serviços de telecomunicações, inclusive atinentes às franquias contratadas de internet móvel e a possibilidade de cláusula que autorize a interrupção do serviço uma vez esgotada a franquia contratada pelo usuário.
O Ministro Marco Aurélio, relator da ADI 6.089/CE, votou no sentido de reconhecer a constitucionalidade da lei estadual. O voto fundamentou-se na compreensão de que o legislador estadual “atuou, de forma suplementar, na proteção do consumidor”, com a finalidade de “ampliar mecanismo de tutela da dignidade dos destinatários finais”.
Dessa maneira, segundo o voto, “preservado o núcleo da regulação, a ser exercida pelo ente central da federação”, estar-se-ia diante de “disciplina voltada à proteção do usuário de serviço público na qualidade de consumidor”, ou seja, “manifestação do exercício da competência concorrente dos Estados para legislar sobre direito do consumidor”. Acompanharam no mérito o voto do relator, os Ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Edson Fachin.
O Ministro Dias Toffoli, divergindo do Ministro relator, reconheceu violação pela norma estadual à competência da União para legislar e explorar, direta ou indiretamente, os serviços de telecomunicações, visto que “a questão do bloqueio de acesso à internet, uma vez esgotada a franquia de dados contratada” se insere “na temática das telecomunicações”. O que também se evidencia, consoante exposto no voto, pela existência de regramento específico da ANATEL acerca do tema tratado na lei do estado do Ceará.
Registrou-se, ademais, que a lei federal mencionada no art. 175, parágrafo único, II, da Constituição, para fins dos direitos dos usuários dos serviços de telecomunicações, é a Lei nº 9.472/1997 a respeito da relação da concessionária do serviço de telefonia com os seus usuários, e não o Código de Consumidor, de maneira que tal questão não comporta “qualquer suplementação legislativa por parte dos demais entes federados, cabendo a regulamentação de tal matéria tão somente ao Poder Público titular do serviço público”. Acompanharam a divergência os Ministros Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Luiz Fux, Nunes Marques, Roberto Barroso e Rosa Weber.
Wilson Sales Belchior