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STJ decide que provedor de e-mail hospedado no exterior deve fornecer dados exigidos pela Justiça brasileira

03/03/2021

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, acompanhando o voto da Ministra Relatora Nancy Andrighi, que a lei brasileira e a jurisdição da autoridade nacional serão aplicadas quando as operações por provedores de internet acontecerem no Brasil, ainda que apenas um dos dispositivos esteja em território nacional e as atividades sejam feitas por empresa no exterior.

A controvérsia originou-se no pedido de fornecimento dos registros de acesso do titular de endereço de e-mail, que teria sido utilizado para a veiculação de ofensas e ameaças, o qual foi deferido em antecipação de tutela. Não cumprida a ordem judicial iniciou-se a execução provisória das astreintes, sendo rejeitada a impugnação e negado provimento ao agravo de instrumento. Afastou-se, consequentemente, o argumento de impossibilidade do cumprimento da obrigação por importar em violação ao direito estadunidense.

No recurso especial, a empresa de tecnologia alegou violação ao art. 11 do Marco Civil da Internet (exigência de que ao menos uma das operações tenha ocorrido em território nacional) e artigo 13 da LINDB (legislação aplicável à produção de provas segundo o local dos fatos), além da incompetência da justiça brasileira para estipular a obrigação de fornecimento dos dados solicitados. Diante disso, delimitou-se o propósito recursal “em determinar a competência do Poder Judiciário brasileiro para a determinação do fornecimento de registros de acesso de endereço de e-mail, localizado em nome de domínio genérico ‘.com’”.

No voto da Ministra Relatora adotaram-se as seguintes considerações sobre a hipótese em julgamento: (1) os destinatários da ofensa têm seu domicílio no Brasil e receberam as ofensas no país; (2) o recebimento e a leitura das mensagens eletrônicas aconteceram em território brasileiro; (3) o provedor de aplicação é empresa subsidiária destinada exclusivamente para operações no Brasil, mas pertencente a grupo econômico com operação mundial; (4) a controvérsia envolve os registros de aplicação.

Dessa maneira, “as ofensas e ameaças encaminhadas por meio de mensagens eletrônicas […] podem ser consideradas como ocorridas em território nacional”, o que atrai, consoante o voto da Ministra Relatora, a jurisdição pátria ao julgamento da controvérsia. Esta é a razão pela qual a concretização de ofensa ao direito brasileiro em aplicação hospedada no exterior autoriza a determinação judicial voltada a remoção do conteúdo ou identificação do autor da conduta.

O Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva acrescentou no voto-vista que antes mesmo da publicação do Marco Civil da Internet a jurisprudência do STJ já havia se consolidado na direção de que empresas subsidiárias atuam na condição de verdadeiras representantes de suas controladoras estrangeiras, podendo responder por seus atos no país. O que se tornou ainda mais claro, conforme exposto no voto-vista, com o artigo 11, § 2º do Marco Civil da Internet “ao estabelecer que se sujeitam à legislação brasileira as atividades relacionadas com a guarda e a disponibilização de registros de conexão e de acesso a aplicações de internet realizadas por pessoa jurídica sediada no exterior”.

Na decisão do REsp nº 1.745.657/SP ficaram consignados os critérios para afastamento da regra da territorialidade da jurisdição em conflitos transfronteiriços de internet: “(1) fortes razões jurídicas de mérito, baseadas no direito local e internacional; (2) proporcionalidade entre a medida e o fim almejado; (3) observância dos procedimentos previstos nas leis locais e internacionais”.

Negou-se provimento ao Recurso Especial, sendo mantido o acórdão do Tribunal de origem que havia determinado o prosseguimento da execução das astreintes em virtude do descumprimento da ordem judicial de fornecimento dos dados que identificassem o usuário de e-mail, autor das ofensas.

Wilson Sales Belchior

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