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OAB questiona no STF a constitucionalidade de Decreto sobre compartilhamento de dados

15/02/2021

Decreto nº 10.046/2019 versa sobre o compartilhamento de dados na Administração Pública Federal

O Conselho Federal da OAB propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade questionando o Decreto nº 10.046/2019. A ADI 6649/DF foi distribuída por prevenção ao Ministro Gilmar Mendes, relator da ADPF 695/DF, que também aborda questões associadas à privacidade, proteção de dados pessoais, compartilhamento de dados pela Administração Pública e constitucionalidade daquele decreto.

 

O Decreto nº 10.046/2019 versa sobre o compartilhamento de dados na Administração Pública Federal, estipulando níveis e regras para esse procedimento. Institui, igualmente, o Cadastro Base do Cidadão e o Comitê Central de Governança de Dados. O primeiro destina-se a criar meio unificado de identificação do cidadão para a prestação de serviços públicos e o segundo é competente para deliberar acerca das diretrizes para compartilhamento de dados e políticas de segurança da informação.

 

Acrescente-se que o artigo 2º do Decreto nº 10.046/2019 apresenta definições que esclarecem a abrangência do compartilhamento mencionado anteriormente. Incluem-se, desse modo: (1) atributos biográficos – nome civil ou social, data de nascimento, filiação, naturalidade, nacionalidade, sexo, estado civil, grupo familiar, endereço e vínculos empregatícios; (2) atributos biométricos – características biológicas e comportamentais como palma da mão, digitais dos dedos, retina ou íris dos olhos, formato da face, voz e maneira de andar; (3) atributos cadastrais – CPF, CNPJ, NIS, PIS, Pasep, número do título de eleitor, entre outros.

 

Na petição inicial da ADI 6649/DF são apontadas inconstitucionalidades formais decorrentes de o Decreto nº 10.046/2019 tratar de matérias com competência privativa de lei, extrapolando os limites da competência constitucional regulamentar, estipulados no artigo 84, IV e VI, “a”, CF/1988; e inconstitucionalidades materiais por conta de violação aos direitos fundamentais à privacidade, proteção de dados pessoais e autodeterminação informativa (art. 1º, caput, III e artigo 5º, caput, X, XII e LXXII, CF/1988).

 

Indica-se, da mesma forma, que o Decreto nº 10.046/2019 contraria a decisão do Supremo Tribunal Federal quando analisou a MP nº 954/2020 acerca do compartilhamento de dados dos usuários de serviços de telefonia fixa e móvel e reconheceu a proteção de dados pessoais e à autodeterminação informativa enquanto direitos fundamentais autônomos. Naquela ocasião, referendou-se medida cautelar deferida para suspender a eficácia daquele ato normativo, visando “prevenir danos irreparáveis à intimidade e ao sigilo da vida privada”. Entendeu-se, portanto, ausente interesse público legítimo no compartilhamento daqueles dados, desatendimento a garantia do devido processo legal, descumprimento das exigências quanto à efetiva proteção dos direitos fundamentais, inexistentes as garantias de tratamento adequado e seguro dos dados e excessiva a conservação de dados pessoais coletados (ADI 6387 MC-Ref, Relatora: Min. Rosa Weber, Tribunal Pleno, julgado em 07/05/2020, DJe 12/11/2020).

 

Frisa-se, ademais, na inicial da ADI 6649/DF, que o Decreto nº 10.046/2019 organiza “uma ferramenta de vigilância estatal extremamente poderosa, que inclui informações pessoais, familiares e laborais básicas de todos os brasileiros, mas também dados pessoais sensíveis, como dados biométricos”. Nesse contexto, argumenta-se que o cadastro e o comitê instituídos pelo Decreto nº 10.046/2019 “desrespeitam princípios basilares da LGPD”, vez que se regulamenta “cadastro unificado que será compartilhado pelos órgãos do poder público federal de forma praticamente livre”.

 

Requereu-se, por fim, a concessão de medida liminar, para “suspender imediatamente a eficácia da integralidade do Decreto nº 10.046/2019 […] e o Cadastro Base do Cidadão”, para cessar qualquer compartilhamento indevido de dados pessoais. No mérito, pleiteou-se a procedência da ADI com a declaração da inconstitucionalidade da referida norma jurídica e a exclusão definitiva do cadastro e do comitê por ela instituídos.

 

Wilson Sales Belchior

 

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